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Primavera brasileira, por Samir Keedi

Crédito: Divulgação

Em novembro de 2011 publicamos nosso artigo “Primavera brasileira”. Incentivando a uma mudança, e nos perguntando quando ela chegaria ao País. Sempre fomos, e não cansamos de dizer e escrever, um país de cordeiros. O que é impossível de contestar. Afinal, tivemos poucas manifestações grandiosas em nossa história, dignas do nome, pelo que sofremos neste País.

E, como sabemos, foram todas localizadas e com comando externo, alheio ao povo em si. A de 1968, a passeata dos cem mil, por exemplo, foi organizada pelo movimento estudantil com apoio de artistas e intelectuais. A das “diretas já”, na década de 1980, que reuniu milhões em praças públicas durante um bom tempo, foi com comando e orientação dos partidos políticos. Não foi uma iniciativa popular, com comando popular, em que os partidos, governos, etc. a seguissem. Outra foi a do impeachment do presidente de plantão. Também esta com comando político, daqueles que discordavam do presidente. E, iniciada por um canal de televisão.
Assim, como se vê, esses eventos tiveram o povo como coadjuvante. Em nosso entender, apenas usado como massa de manobra, para utilizar uma expressão dos anos 60. O que tem sido comum em nosso país varonil, cor de anil.

Somos um país em que as políticas adotadas jamais visam o aumento do bem estar da população. Isso só ocorre por acaso, e se houver alguma vantagem política e financeira para quem a realiza. O que se faz é sempre com intuito eleitoreiro. O melhor exemplo disso hoje é a bolsa-esmola. Maior compra de votos que existe no País. Pela quantidade de famílias e pessoas envolvidas, 14 e 60 milhões, respectivamente, talvez o maior programa de vinculação da nossa história, provavelmente, do mundo.

 

 

 

Em que, inclusive, esses beneficiários contam como empregados e, assim, não entram no cômputo do desemprego no País. Fazendo com que este seja baixíssimo, um dos menores do mundo. Esta é mais uma informação para a coleção daqueles que não sabem o que acontece no País, e que não procuram saber. Aqueles que, como sempre dissemos, vivem em Marte. Fatos que as pessoas não se dão contam, e para o qual não fazem conta. Temos um povo que ainda não descobriu a pesquisa, a leitura, a educação como um todo.
Finalmente este País parece estar acordando e buscando a sua primavera. Aquela na qual temos trabalhado há anos para que o povo levante de seu berço esplêndido. Expressão que vimos usando constantemente ao longo do tempo. Mas não apenas nós. Em que sempre dissemos que o nosso erro começava pelo Hino Nacional, com esta infeliz frase.

O povo resolveu, de repente, como num “passe de mágica”, exercitar seus direitos. O começo foi apenas pela reclamação do aumento de R$ 0,20 no preço da passagem de ônibus. Com o desenvolvimento das manifestações tudo que estava engasgado, e muitas vezes nem notado, veio à tona. A população brasileira acabou percebendo e conhecendo sua força. Como sempre dissemos a nossos alunos, há quase duas décadas, a força estava com eles. Quase sempre usamos os termos “o povo é o He-man, ou she-woman, aquele que tem a força.

As últimas semanas vêm mostrando que o povo estava cansado, e só não havia percebido. Mas, como tudo tem limite, uma hora o copo teria que transbordar. Ainda que fosse por algo simples como ocorreu. Terá chegado o momento? Acreditamos que sim.
Com a explosão social atual, vieram à tona os motivos pelos quais se deve lutar. Na questão do transporte, não pelo simples preço da passagem. Mas por um transporte melhor. Por melhores salários para que se possa pagar a passagem e um transporte digno.
E, assim, com todas as coisas que fazem da nossa vida o inferno na terra. Mais precisamente no nosso País. Aquele que menos cresce no mundo, em que nos últimos 33 anos, incluindo este, estamos empatando, jogando fora tudo que fizemos de melhor entre 1901 e 1980. Em que ocorreram crescimentos dignos de um país que quer ser “alguém quando crescer” (sic). Não as fantasias vendidas pelos nossos governantes, bem como economistas e imprensa chapas brancas.

Acreditamos que agora, que a porta foi arrombada, muitos mudem de lado, como já vem ocorrendo nos últimos dias. Pela primeira vez os governos e políticos estão indo atrás do povo, depois de pegos de surpresa. Surpresa estranha, pois todos os problemas estavam ai como sempre apontamos. Só esperamos que o ânimo do povo não arrefeça por algumas pequenas conquistas. Que continue procurando seus direitos. Que entenda que apenas uma batalha foi vencida. E uma pequena batalha, pois ainda não se fez quase nada.

Assim, povo deste País grande, chegou a hora de inverter e fazer um grande país. Deixar de ser apenas o acampamento que vimos denunciando por anos para sermos um país, uma nação. E isso não se conquista em pouco tempo, como alguns meses. Isso se conquista em muitos anos. Assim, alerta e a postos.
Brasil, agora que acordou, permaneça acordado. Melhor sentado que deitado. Melhor em pé que sentado. Melhor correndo que andando. “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer” como o próprio povo descobriu.
Artigo divulgado pelo jornal DCI, em agosto de 2013.